domingo, 31 de janeiro de 2010

Luar na Sambaíba


"A volúpia corporal é uma vivência dos sentidos, não difere do simples olhar ou da pura sensação de água na boca causada por uma fruta; ela é uma grande experiência, infinita, que nos é dada, um saber do mundo, a plenitude e o brilho de todo saber. Não é ruim o fato de a aceitarmos; ruim é o fato de que quase todos abusam dessa experiência e a desperdiçam, usando-a como um estímulo nos momentos cansados de sua vida, como uma distração, em vez de uma concentração para alcançar pontos mais altos. Os homens converteram até mesmo o ato de comer em uma outra coisa: carência por um lado e excesso por outro. Obscureceram a clareza dessa necessidade; e igualmente obscurecidas se tornaram todas as necessidades profundas e simples nas quais a vida se renova."

(Rainer Maria Rilke em "Cartas a um jovem poeta")

  


Na ambiência do extraordinário texto de Rilke, nada melhor do que a inebriante "You'll Never Find Another Love Like Mine", com Lou Rawls.

sábado, 30 de janeiro de 2010

Urca


 
  
  
    

Passei boa parte da tarde de hoje lendo poesia. Trago esta, de Cecília Meireles, para acompanhar as imagens feitas na Urca.

Soneto antigo

Responder a perguntas não respondo.
Perguntas impossíveis não pergunto.
Só do que sei de mim aos outros conto:
de mim, atravessada pelo mundo.

Toda a minha experiência, o meu estudo,
sou eu mesma que, em solidão paciente,
recolho do que em mim observo e escuto
muda lição, que ninguém mais entende.

O que sou vale mais do que o meu canto.
Apenas em linguagem vou dizendo
caminhos invisíveis por onde ando.

Tudo é secreto e de remoto exemplo.
Todos ouvimos, longe, o apelo do anjo.
E todos somos pura flor de vento.


E, por falar em Urca, a música de seu morador mais ilustre, Roberto (com Erasmo), na voz de Ney Matogrosso, "A Distância":



quinta-feira, 28 de janeiro de 2010

O mundo




Ontem fui na Mamma Jamma, pizzaria-butique que abriu onde era o Saturnino, no Jardim Botânico. Ambiente muito bonitinho, atendimento bom, pizza ótima (na textura certa para mim, totalmente avessa à tal da massa fininha, que pode ser tudo, menos pizza). Devo honrar meu sobrenome!

Tudo ia muito bem, o malbec macio. Até chegar o momento em que toda mulher precisa, digamos assim, pentear o cabelo. No hall dos toaletes, o que temos? Ai, ai, ai, senhoras e senhores...aquelas indefectíveis plaquetas que teimam em confundir o acesso a banheiros com ante-salas de museus.

Sejamos francos. Quem de vocês, diante da necessidade imperiosa de retocar o penteado, acha graça em passar longuíssimos segundos precisando decifrar símbolos, abstrações, cores, traços, enfim, quaisquer elementos que intentem diferenciar o local destinado a mulheres e homens?

Ah, que saudade do velho e bom H & M ou M& F...

Cara, na boa...se eu quiser contemplar instalações, esperarei a Bienal de São Paulo. De uma porta de banheiro de restaurante desejo mais objetividade (e limpeza) e menos arte.

Em tempos de Fórum de Davos e de drible ao Tribunal de Contas da União, vamos de música:

"O Mundo" (de André Abujamra), com Moska, Lenine e Zeca Baleiro.


 

segunda-feira, 25 de janeiro de 2010

Paraísos artificiais


Não sei vocês - que também são brasileiros -, mas eu não quero ser levada ao paraíso pela Dilma Rousseff. Prefiro outras mãos como guia.

A coluna de Ricardo Noblat de hoje, no Globo, me representa.

E essa história de PT e PMDB fiscalizarem a nova Superintendência Nacional de Previdência Complementar, agência reguladora dos cofres arquibiliardários dos fundos de pensão? Vocês é que estão dizendo que é escalar raposa pra tomar conta de galinheiro. Eu nada entendo de política.

Depois de um domingo ao lado de minha afilhada, saudável e feliz andando pela casa, está bem fresca em mim a noção do que seja paraíso. E natural.

E vou é de "Sorria", com Os Travessos.

sábado, 23 de janeiro de 2010

"A vida é um desmentido"



A coluna de José Castello no Prosa&Verso (O Globo) de hoje gira em torno da coletânea organizada por Ítalo Moriconi (que foi meu professor na faculdade) de poemas de Ana Cristina Cesar, Cacaso, Paulo Leminski, Torquato Neto e Waly Salomão.

E já começa impactante com os versos de Cacaso: "Minha pátria é minha infância / Por isso vivo no exílio".

Que tal?

Mais adiante, Castello lembra palavras ditas por Waly em seu ouvido durante debate - que, a princípio, seria dividido entre eles dois -, desculpando-se por falar sem parar e não deixar brecha para o amigo: "Parece que nunca dou dentro de mim".

Que tal 2?

E Leminski: "Marginal é quem escreve à margem / deixando branca a página / para que a paisagem passe / e deixe tudo claro à sua passagem". Sobre esses versos, Castello observa: "Habitar a margem foi uma maneira de expor o grande vazio do miolo".

Mais é a respeito do poema de Cacaso que o colunista brilha. Diz ele: "Estamos sempre deslocados - em relação às crianças que fomos, ao futuro projetado por nossos pais, aos esforços ferverosos da educação. Às certezas (precárias) que aprendemos a aceitar. A vida é um desmentido".

A vida é um desmentido. Que frase! De um poder de síntese absurdo. Pois não é a vida essa força ingovernável a desmontar incansavelmente teses, planos, convicções...as relações mais profundas e "eternas"?

Ainda no Globo, mas o de quinta, saiu uma matéria sobre a exposição aberta esta semana na Royal Academy of Arts, em Londres, com a correspondência de Van Gogh para várias pessoas, entre elas, Theo, seu irmão e mecenas.

Muito me admirou, dentro de uma matéria relativamente longa - meia página -, não ter sido mencionado o livro "Cartas a Theo" (L&PM), que traz justamente as cartas escritas pelo extraordinário holandês a seu irmão entre 1873 e 1890.

Para quem ama arte, esse livro é imperdível, pois, como bem declarou a curadora do evento, desmistifica a ideia de que VG "era apenas um gênio louco que pintava como se sofresse espasmos".

Muito longe disso. Ao ler esse livro há muitos anos (pesquisando agora, descobri que em 2002 foi lançada uma edição em que se acrescentaram mais de 100 cartas em relação à primeira, de 1997), fiquei impressionada com a profunda noção de técnica demonstrada por ele (desde sempre, meu pintor preferido). Mais ainda: como conseguia formular tão bem seu pensamento por escrito.

Jamais esquecerei a primeira vez em que contemplei seus quadros ao vivo, quando os impressionistas ainda habitavam o Jeu de Paume, no Louvre. Aquela explosão de cores inigualável, a intensidade dos sentimentos ali transbordante, a complexidade de emoções por eles provocadas...nada daquilo me convencia ser produto pura e simplesmente de uma cabeça atormentada por natureza e alucinada por absinto.

Quando li "Cartas a Theo", tudo se iluminou. Havia muito, muito além. Desde então, recomendo esse livro a tantos que acho que irão se apaixonar por ele. E agora, com o prazer de sempre, mais uma vez. Eu mesma vou atrás dessa versão atualizada, que desconhecia existir. Cá pra nós, bem melhor que estar em Londres para ver a exposição. Além do frio glacial que está fazendo por lá, seria muito desconfortável ler cartas como essas em pé...


domingo, 17 de janeiro de 2010


Acabei de ler "Guinga, Os mais belos acordes do subúrbio", escrito pelo jornalista Mario Marques. Em determinado momento, ele diz: "Uma tarde de papo com Guinga pode causar interferências irreversíveis". Verdade verdadeira.

Aproveito para puxar uma brasinha pro meu peixe, o perfil que fiz para a Carioquice com o poeta das cordas.  Uma conversa de duas horas, em duas poltroninhas lado a lado no lounge do Rio Design Center, no Leblon. Sem um gole de água, café, nada. Gente circulando sem parar, nada que propiciasse um ambiente ideal para megulhar com acuidade e precisão no universo transbordante desse criador, para o qual não há palavras que cheguem. Mas, estranhamente, parecia que estávamos num outro planeta - e estávamos mesmo: o planeta profundo, misterioso e cheio de silêncios da música. Minha entrevista com Guinga foi a mais tocante que fiz na vida.

Olha que que coisa mais linda: “Só eu sei o que fiz para poder fazer uma obra. Só eu sei o sacrifício. Eu não dormia. Saía de casa às cinco da manhã para abrir a minha clínica às seis e meia e ficava lá até as dez da noite. Nunca tirei férias. Compunha dentro do consultório e deixava de dormir para criar – só dormia uma média de três horas por noite.” 


 



Azul Marinho, Arpoador 
 

Lagoa 

 

sexta-feira, 15 de janeiro de 2010

Caros,

Em resposta a comentários e emails que recebo perguntando sobre novos textos e o sumiço das enquetes:

Em relação a estas, adoro fazê-las e, com a quantidade de assunto disponível, poderia postar várias por dia. É sempre um momento bem humorado de observar criticamente o que estamos vivendo, sobretudo na vida nacional.

Mas os acontecimentos no final do ano me desestimularam: as cenas degradantes (e recorrentes) de dinheiro sendo enfiado em meias e calças em Brasília, com as criaturas em suposto (e inacreditável) momento de oração pela "graça" obtida; os oportunismos de imagem na COP-15; e - que horror! - o linguajar presidencial para exprimir saneamento básico - esse investimento de primeira necessidade cuja falta histórica compromete a dignidade de tantos brasileiros.

Sinceramente...é quase impossível eu não querer fazer graça de tudo. Mas sobre os dois primeiros itens, sem comentários. A respeito do último, acho de uma tristeza infinita que o presidente da República, à guisa de falar "a língua do povo" - e assim subestimar a capacidade de pessoas simples de entender palavras como "água" e "esgoto" - recorra a palavrão.Enquanto Lula é reverenciado como um mestre da comunicação, com suas metáforas futebolísticas para traduzir economês e politiquês, vá lá. Mas palavrão é recurso muito feio, vulgar, acho eu, mesmo no dia a dia e entre amigos. Que dirá na boca da maior autoridade do país.

Se meu filho chegasse em casa dizendo que o presidente quer tirar o povo da M, como explicar a ele que esse não é um modo adequado de se expressar? Tudo tão leviano, tão irresponsável. E tão impune. E o que dizer da tosca história do "porco e do dono do porco"? Caetano, recententemente, declarou que Lula se expressava de forma cafona e grosseira. Se fosse só cafona, uma questão - ainda que lamentável - estilística. Mas grosseria...Hoje, lendo a palestra de um empresário em 2008, ele disse: "Tenho às vezes vergonha de como ele (o presidente) fala". Que Lula agrida, sem dó nem piedade, a gramática e não demonstre um átimo de interesse em disfarçar o desprezo pela nossa língua, que restrinja esse "costume" deplorável a sua casa, ou ao seu palácio. Enfim, aos seus. Em público, exijamos mais. Nossas crianças merecem. Todos merecemos respeito e fala educada.

Por fim, essa situação tristíssima em nosso Estado no início do ano. E, agora, indizível, no Haiti. Mentalizemos e oremos por todos. A respeito de nossa Dra. Zilda Arns, li no Globo um pensamento do teólogo Luiz Antonio Ricci, atribuído à Madre Teresa de Calcutá: "Não podemos permitir que uma pessoa deixe a nossa presença sem se sentir melhor e mais feliz".

Impossível agradecer a mobilização de tantos - médicos, bombeiros, voluntários, jornalistas - que, com todas as dificuldades, estão indo para lá, numa atitude impregnada de uma humanidade assombrosa.

segunda-feira, 4 de janeiro de 2010

Aldeia


Eis aqui, para minha alegria, Leila Pinheiro cantando "Aldeia", uma de minhas parcerias com meu querido Rodrigo Lessa (já gravada por Dona Ivone Lara), em show com o Nó em Pingo D´Água, no Teatro Carlos Gomes-RJ.

Rodrigo me mandou essa melodia linda, que imediatamente me transportou para um universo longínquo de delicadezas, numa modulação impregnada de movimentos puros, ingênuos, sutis. Logo imaginei uma cidadezinha do interior, alguém que dela saiu e que agora volta para reencontrar os sinais elementares de sua terra e - o maior de todos -, seu grande amor.


Leila Pinheiro - Teatro Carlos Gomes - Show com o Nó em Pingo D´Água

Música: Aldeia (Rodrigo Lessa-Monica Sinelli)

domingo, 3 de janeiro de 2010


Li em algumas horas "O Seminarista" (de Rubem Fonseca). Para quem tem estômago forte.

Um trecho "hora do recreio" do livro: "Não sei se já disse que durmo muito pouco. Li, num livro, uma frase atribuída aos vitorianos, segundo a qual o correto em matéria de sono seriam seis horas para os homens, sete horas para as mulheres e oito para os imbecis".

Pessoalmente, nunca entendi quem diz adorar dormir. Pra mim, dormir é reparação de energias gastas, não objeto de prazer. Que prazer a pessoa pode ter em dormir? (Falo dentro das CNTP, não em casos de insônia, evidentemente). E mais, dormir muito? Eu, hein...tanta coisa interessante pra fazer acordada e que as horas não chegam pra tanto...Cada vez acho mais legal acordar (bem) cedo, inclusive no fim de semana. A luz é linda, aproveita-se mais o dia...Mas, enfim...há gosto pra tudo. Adorei saber que me alinho ao marco regulatório vitoriano.

Iniciei, também, "Clarice, uma biografia", de (Benjamin Moser), um universo de quase 650 páginas, para o qual me preparo para mergulhar com a concentração, o apuro e a entrega indispensáveis. Mas essa é leitura a ser degustada com vagar.


E o incrível Klaus Nomi em "The cold song": http://www.youtube.com/watch?v=C_A6IR58Htg

sábado, 2 de janeiro de 2010

Acorda, vem ver a lua

Luar da Sambaíba


Recebi a indicação dessa música linda de Maria Gadú ("Altar particular"):



"Pra ser só minha mulher" (Ronnie Von e Tony Osanah), com Otto:

E a mesma música na versão arrasadora do Rei:
http://letras.terra.com.br/roberto-carlos/473362/

A todos, mágicos momentos de lua cheia nessas noites quentes de verão.

Para isso, nada melhor que:

"Blue moon" (Richard Rodgers and Lorenz Hart), com Ella Fitzgerald
http://www.youtube.com/watch?v=4218R-gBmts

"Someone to watch over me" ( George Gershwin), com Sting:

E a sublime "Melodia sentimental" (Villa-Lobos e Dora Vasconcelos), com Bethânia:

sexta-feira, 1 de janeiro de 2010

Irremediável néon


Revéillon em Copa

 







"A cor do sol" (Cidade Negra):

Experimente para ver se dá
Viva sempre, aproveite o momento


2010 beijos a todos!