segunda-feira, 1 de agosto de 2011

O escafandrista no abismo de Clarice

 

Fotos: Roberta Lenzi e Érika Guimarães - Machu Picchu

Para mergulhar no "abismo de Clarice Lispector", curso que acabo de fazer com o escafandrista literário José Castello (escritor e colunista do caderno Prosa&Verso do Globo), na Casa do Saber, me entreguei sem rede de proteção - não há outro alternativa- à re-re-releitura do universo dessa escritora impossível.

Escafandrista literário foi uma expressão que me ocorreu para referência (sem que se precise de alguma) a Castello - a quem entrevistei para a Carioquice (http://www.carioquice.com.br/upload25/25/05.pdf), que recusa o rótulo de "crítico" de Literatura.

Tampouco o que Castello publica em sua coluna (imperdível!) aos sábados se acomoda à categoria formal de "análise literária": não é investigação acadêmica de fundamentos linguísticos, nem uma apreciação clássica de estilos ou coisa que o valha.

O que ele escreve no jornal (e também em seus livros) é de outro reino, tão revolvente, visceral e indefinido, que, por aproximação, o percebemos em Clarice: ela era escritora, filósofa...era o que, afinal? A melhor definição (novamente, sem que se imponha uma) que já vi: "Ninguém escreve como ela. Ela escreve como ninguém".

Castello, também jornalista, é o que, afinal?

Como precisamos, desesperadamente, enquadrar os outros - sobretudo os incabíveis!


Vou, assim, atrás de pegadas - antigas e fescas - em:

Perto do coração selvagem, o primeiro livro de CL, que, aos 17 anos de idade, fulminava: "Que se fuja - e nunca se estará livre". Com 17???

Na sequência, Água Viva: "Que estou tentando eu ao te escrever? Estou tentando fotografar o perfume"..."Não me posso resumir porque não se pode somar uma cadeira e duas maçãs. Eu sou uma cadeira e duas maçã. E não me somo"..."O que é que na loucura da franqueza uma pessoa diria a si mesma"?

A Paixão segundo GH: "Quando se realiza o viver, pergunta-se: mas era só isto? E a resposta é: não é só isto, é exatamente isto"..."Pois prescindir da esperança significa que eu tenho que passar a viver, e não apenas a me prometer a vida"..."Se eu der o grito de alarme de estar viva, em mudez e dureza me arrastarão, pois arrastam os que saem para fora do mundo possível, o ser excepcional é arrastado, o ser gritante"..."Pela primeira vez eu me espantava de sentir que havia fundado toda uma esperança em vir a ser aquilo que eu não era."

Uma aprendizagem ou O livro dos prazeres: "Ser tão protegida a ponto de não recear ser livre"..."Ah, então é verdade que eu não imaginei: eu existo."

"Mas olhe para todos ao seu redor e veja o que temos feito de nós e a isso considerado vitória nossa de cada dia. Temos amontoado coisas e seguranças por não termos um ao outro. Não temos nenhuma alegria que já não tenha sido catalogada. Temos construído catedrais e ficado do lado de fora, pois as catedrais que nós mesmos construímos, tememos que sejam armadilhas. Não nos temos entregue a nós mesmos, pois isso seria o começo de uma vida larga e nós a tememos. Temos disfarçado com o pequeno medo o grande medo maior e por isso nunca falamos no que realmente importa.Temos temido um ao outro, acima de tudo. E a tudo isso consideramos a vitória nossa de cada dia".

"Eles pareciam saber que quando o amor é grande demais e quando um não podia viver sem o outro, esse amor não era mais aplicável: nem a pessoa amada tinha a capacidade de receber tanto".

"Não se enganava a si mesma: era possível que aqueles momentos perfeitos passassem? Deixando-a no meio de um caminho desconhecido? Mas ela poderia sempre reter nas mãos um pouco do que agora conhecia, e então seria mais fácil viver não vivendo, mal vivendo. Mesmo que nunca mais fosse sentir a grave e suave força de existir e amar, como agora, daí em diante ela já sabia pelo que esperar a vida inteira se necessário, e se necessário jamais ter de novo o que esperava. Moveu-se de súbito na cama, porque foi insuportável imaginar por um instante que talvez nunca mais se repetisse a sua profunda existência na Terra".

Para mim, Castello é o escafandrista que, com sua lanterna, ao contrário de apontar para um único - e seguro - caminho, ajuda a iluminar atalhos, na perigosa descida às profundezas e aos labirintos escuros que a Literatura espalha, às vezes com delicadeza, por outras, violentamente. Sempre a exigir entrega total.

Trilha sonora: "Eu sei que vou te amar" (Tom e Vinícius), com Caetano Veloso:
http://letras.terra.com.br/caetano-veloso/187300/


E o presente delicado da Ana Lúcia:
 

 

9 comentários:

  1. De arrepiar! Amo muito tudo isso aqui!!!
    beijos
    Dani

    ResponderExcluir
  2. E' de emocionar !!!!
    Emoc,a~o pura !!!

    Obrigada Sinelli !!

    beijos
    Lenzi

    ResponderExcluir
  3. O "abismo de Clarice Lispector" com o visual de Machu Picchu , as lembranc,as de la' vieram ainda mais fortes !!!

    Valeu !!!

    ResponderExcluir
  4. Iguarias refinadíssimas!
    Será que agora teremos fornadas com mais constância?
    Torço pra que sim.
    Bjos
    Fabinho

    ResponderExcluir
  5. Um paraíso essa padaria
    Um beijo
    Lulu

    ResponderExcluir
  6. Ei, Mônica, você e seu mundo incrível e com sensibilidade gritante....
    As saudades de sempre
    D.

    ResponderExcluir
  7. Moniquete!
    Te vi na primeira fila do show da Marina sábado.
    Mas o show começou de repente quando eu estava indo falar com você.
    Depois, não consegui te achar mais...
    Que pena...muita saudade!
    Beijo enorme
    Alex

    ResponderExcluir
  8. Alex, querido, pena mesmo não nos encontrarmos.
    Estou com uma entorse no joelho e por isso saí do show logo que acabou.
    Só fui mesmo pq era a Marina.
    Espere em breve uma postagem a respeito. Vai ter uma novidade bem bacana.
    Bj grande.
    M

    ResponderExcluir
  9. Machucada, você????? Isso não se faz com a minha rainha!
    Melhoras rápidas. Queremos você sem dor e feliz.
    Bjs bjs

    ResponderExcluir

Comentário