segunda-feira, 8 de março de 2010

Saturday night fever

 Pau ferro - árvore no Museu Chácara do Céu

A programação de rua no sábado começou na Travessa do Leblon, porque queria comprar um novo Partimpim 2 para dar de presente. Aproveitei para garantir uma cota de mimos para mim também: os livros "Chão de terra" (de Rosiska de Oliveira), a nova e deslumbrante edição de "Alice no país das maravilhas" (com tradução de Nicolau Sevcenko e ilustrações de Luiz Zerbini) e o CD "Noturno Copacabana" (de Guinga), que traz uma música que eu estava procurando na internet para postar aqui (a sublime e doce "Senhorinha", com letra de Paulo César Pinheiro).

Achei um vídeo em que Guinga - esse, cuja sensibilidade musical é indizível - conta, de forma emocionante, como nasceu essa levitante canção, aqui interpretada por ele e a linda Zezé Gonzaga.



Na sequência, finalmente consegui ver a exposição de Cildo Meireles no Museu da Chácara do Céu, em Santa Teresa.  


 
 
 
 
 
 
 
 
Na descida, uma parada na rua do Lavradio, onde, como em todo primeiro sábado do mês, corria solta a feirinha. Numa mesinha de calçada do botequim Informal, enquanto me dedicava a um cachorro quente incrementado com mostarda preta e uma diferente (e ótima) pasta de pepino adocicada, esquadrinhava a paisagem, me convencendo de que os timbres escuros que manchavam o céu já não me renderiam boas fotos. Então, um raio, depois outro, mais outro...Falei: vamos embora!

Era por volta de cinco da tarde. Não houve tempo nem de pedir a conta. Debaixo do temporal, o pessoal que ocupava as mesinhas do lado de fora do bar (assim como os donos das barraquinhas da feira) evaporou na atmosfera. Nós, um grupo de 7, tratamos de nos aninhar sob o toldo do estabelecimento, quando o gerente bradou: "vamos fechar a porta, porque a água vai entrar aqui".

Incrédula de que, com apenas alguns minutos de aguaceiro, ele poderia decretar que não só a rua iria transbordar como invadir boteco adentro (uma vez que se situa em patamar acima do nível do logradouro), quando vi, estava sentada na escada entre os dois pisos junto com a galera - o único espaço livre de que dispúnhamos. Que sorte! Em pouco tempo, assistia desse que eu já considerava um camarote de primeira classe, seco e seguro, com direito a chope, as águas avançando com vontade no primeiro piso do bar, em ondas escuras que expunham com clarezas líquidas e sólidas a maneira como cuidamos de nossa cidade.

Rua (ou rio) do Lavradio

Impossível não relacionar à cena inquietante as catástrofes da natureza tão mais apavorantes que estamos vendo diariamente no mundo todo. Do meu degrau, contudo, espreitava pelas frestas do corrimão o desenvolver de cenas de um microcosmo, por força das circuntâncias, obrigado a ser aquele, deslocando meu olhar de mesa em mesa. Aparentemente, os que estavam no andar de baixo, com água imunda pelas canelas, assemelhavam-se a estar num cruzeiro marítimo em que alguma espuma, fortuitamente, molhara o convés.

Numa delas, mulheres em pé nas cadeiras, dançavam ao som de sambas que iam improvisando como se não houvesse amanhã.

Em outra, onde parecia celebrar-se um aniversário, havia um casal de 20 e poucos anos em franca desarmonia. Ele, um garoto bonito, que insistia em continuar ali bebendo - embora já bem alterado, sem os sapatos, as meias encharcadas naquele rio encorpado de detritos. Nela, tudo era mais pesado e devastador do que a tempestade lá fora. Tentava a todo custo levar o menino de lindos cabelos pretos para casa. Houve um momento de ternura entre os dois, em que ela, tão novinha, era mais mãe do que mulher dele.

Imaginei que essa situação de conflito se suceda noite após noite. Na mesa, havia duas mães com seus bebês. Logo intuí também que ela, olhando para aquelas crianças, desejasse ter a sua com o tal rapaz bonito, e levar uma vida tranquila em família.

Como que chacoalhada por um pensamento que me alertava que eu não tinha nada a ver com a vida alheia e que tinha limite a profissão repórter, desviei minha atenção daquele frame. Por fim, lá pela meia-noite, conseguimos descer para uma mesa, porque alguns clientes haviam ido embora mesmo na enxurrada.

Fiquei em frente à mesa do tal menino. E lá, já não estava a mulher dele. Ele havia preferido permanecer por lá, em companhias, digamos, mais animadas. Imaginei aquela menina em casa, a esperar por ele, na escuridão do quarto. Aflita, sem saber se iria voltar. Pronto, lá estava eu a entabular fabulações sobre a vida do próximo.

Resumo: era uma da manhã quando pudemos, por fim, deixar o restaurante com o baixar das águas.

Diante do narrado, não foi possível dar à Mimi, que comemorava 10 anos de vida no Clube Marimbás àquela tarde, o disquinho da Calcanhotto. Mas desejo a você, minha amiguinha, o construir de seus sonhos numa cidade limpa e cada vez mais bela, num país que respeite direitos e deveres e num mundo que, afinal, se irmane.

                                                     
      Parque das Ruínas

2 comentários:

  1. Sentimos sua falta no aniversário Sinelli !!!!

    Vamos nos encontrar nesse final de semana de preferência, sem chuva !!!!!

    Obrigada pela lembrança !!!

    beijos da Ro, Li e Mimi !!!

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  2. Amiguinha,

    Senti falta da sua alegria na festa da Mimi...

    Bjs,

    Lili Gilberto

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